entra e diverte-te, ou o marquês ocupado por dentro e por fora

por um mundo mais justo (vídeo)

Marquês em Festa! Traz comida para uma merenda na praça; traz o que não queres e leva o que quiseres na Loja Livre. Traz exposições, painéis e animação, traz crianças, amigos e o teu cão. Traz música e os teus instrumentos, pincéis, telas cartazes e sentimentos. Traz xadrez, livros, batuques e capoeira, baralhos de cartas, mesa e uma cadeira. E se não tiveres nada do que está aqui…
Aparece e traz-te a ti!

Houve quase de tudo um pouco do que estava anunciado nos cartazes afixados na praça do marquês e arredores. E houve até a surpresa de poder usufruir do espaço que outrora foi biblioteca infantil, há quase uma década fechado e vazio, cujas paredes exteriores vêm servindo de urinol. Sábado, 19 de Julho.

O início da festa estava programado para as dez, mas já passava do meio-dia quando se notaram as primeiras movimentações. Uma loja livre, duas prateleiras com livros e jogos e duas instalações fotográficas depois, a Biblioteca Popular Pedro Ivo, estrutura com 60 anos, voltava a estar preenchida, viva, com coisas para dar a quem quisesse entrar... e foram bastantes. Parabéns! Finalmente aberta outra vez, chegou-se a ouvir. Um folheto explicava que não se tratava duma espécie de privatização, que os ocupantes momentâneos da biblioteca mais não queriam ser do que isso mesmo e que estavam ali com o intuito de espalhar o vírus, para que outras pessoas, alguém que quisesse dar uma utilidade pública ao espaço, o ocupassem.

Cá fora, cresciam outros universos. Uma banca com informação crítica dos organismos geneticamente modificados, uma exposição fotográfica sobre o próprio jardim, que se revelou bastante concorrida, um espaço para pintura, verdadeiro sucesso entre a criançada que por lá passeava, mesas de xadrez e alguns jogos, com destaque para a petanga, jogada até ao limite da destruição do material.

À hora de almoço popular chegou a feijoada vegetariana. E foi óptimo comer sentado no chão, naquela sala ao ar livre em que estava transformada a pequena praça, se assim se lhe pode chamar, que existe à frente da biblioteca. Sentado no chão é como quem diz, que até as galinhas gostam de conforto e a terra foi coberta por uma alcatifa verdinha, da cor da relva que, finalmente, parece querer voltar a crescer nos canteiros circundantes. Isto, claro, para quem não teve a sorte de se sentar no sofá, com copo de vinho, cerveja, água ou sumo, e papo cheio, à espera das já mundialmente famosas sobremesas da Pi e do café fatalmente subsequente.

A animação continuava. Havia um roque ao mesmo tempo que o André, rapaz que passeava com o pai, fazia a sua última pincelada. Ao lado, o irmão acertava com a bola de petanga nas pernas duma pessoa qualquer. Um pedido de desculpa e dois sorrisos sanaram tudo. Um homem saía da biblioteca com livros e uma máquina de café. Logo depois, alguém escolheu uma peça de roupa. Numa das árvores, as pessoas podiam escrever um dos versos dum poema que, lido de cima para baixo, mostra as promessas dos políticos e, de baixo para cima, desmascara a realidade.

De repente, tudo parou e juntou-se uma pequena multidão à frente da biblioteca. Começava o concerto da Fanfarra Recreativa Improvisada Colher de Sopa, ponto de união entre algumas das mais obscuras celebridades do underground portuense, famosa pela sua tournée nacional por capitais de distrito... por ordem alfabética. Um momento, como sempre, sublime e sublinhado por um prolongado aplauso também para o Licínio que não se cansou de abastecer a banda de cerveja, com tanto profissionalismo que nem dele próprio se esqueceu.

Entre sorrisos, não esquecemos que é preciso cerrar os dentes e a jornada acabou com uma conversa em pleno jardim, onde discutimos quanto tempo o tempo tem e, neste mundo em que, tal como o trabalho, o lazer é uma obrigação, que atitudes tomar para promover alternativas e evitar que no-lo roubem. A meio, a praça encheu-se de polícia. Pouco tempo depois, chegam os bombeiros. Trataram de reabrir a porta do elevador do Metro que se tinha avariado e foram à vida deles. A vinte metros, uma biblioteca estava ocupada. Nada que os impedisse de não se importarem.

A tarde começava a desaparecer, dando lugar ao lusco-fusco que a Luísa tanto adora, e era hora de recolher. No jardim, a Biblioteca Popular Pedro Ivo ficava como a encontramos nessa manhã, vazia, de porta escancarada, à espera de quem a ocupe. Entra e diverte-te, ficou escrito numa das janelas.

cartaz

biblioteca infantil




loja livre



























livros e jogos

instalações


apropriação da propriedade




























informação sobre transgénicos

exposição






pintura




xadrez


petanga

feijoada vegetariana


animação





antes e depois da posse

Divulgação/intervenção com o texto "ANTES E DEPOIS DA POSSE" (última página do "Coice de Mula" n.º 8)

O nosso partido cumpre o que promete.
Só os tolos podem crer que
Não lutaremos contra a corrupção.
Porque se há algo certo para nos, é que
A honestidade e a transparência são fundamentais
Para alcançar os nossos ideais.
Mostraremos que é uma grande estupidez crer que
As máfias continuarão no governo, como sempre.
Asseguramos sem dúvida que
A justiça social será o alvo da nossa acção.
Apesar disso, há idiotas que imaginam que
Se possa governar com as manchas da velha política.
Quando assumirmos o poder, faremos tudo para que
Se termine com os caciques e as negociatas.
Não permitiremos de nenhum modo que
As nossas crianças morram de fome.
Cumpriremos os nossos propósitos mesmo que
Os recursos económicos do país se esgotem.
Exerceremos o poder até que
Compreendam que
Somos a nova política.

O texto, escrito habilmente, denuncia a manipulação dos eleitores levada a cabo pelos políticos. Lido de cima para baixo surgem as propostas dos políticos. De baixo para cima, o que deveriam dizer, de facto.

Foi dado o texto a ler a transeuntes ou curiosos da acção no Marquês (com excepção de duas que eram conhecidas - durante o processo-, e de mais duas - no fim, para que este se completasse e se desse início ao debate relatado acima), sendo pedido a cada pessoa que concordasse com aquela denúncia que escolhesse uma linha do texto para a escrever num painel. No final todo o texto deveria ser completado e estar livre para leitura geral.


Verificou-se que o texto, tendo 21 linhas, exigiu a abordagem de 25 pessoas, havendo apenas quatro que recusaram escrever uma linha pela sua própria mão, o que significa uma altíssima taxa de pessoas a quem os políticos não merecem crédito.

Outra situação interessante e que merece reflexão é a de que entre os quatro que recusaram, três (entre as quais uma das duas conhecidas) eram pessoas da esfera de influência "comunista": um anti-fascista, cujo pai foi companheiro do Cunhal, um ex-dirigente sindical e um militante ou simpatizante.

Iniciativa proposta pelo Colectivo Hipátia para o "Marquês em Festa"

concerto FRICS



































debate sobre TEMPO | TRABALHO | LAZER

Iniciou-se com um relembrar de provérbios (e ditos, e lengalengas) pelos presentes:


"Saber esperar é uma grande virtude";

"Quem espera desespera";

"Quem espera sempre alcança";

"O tempo perguntou ao tempo quanto tempo o tempo tem, o tempo respondeu ao tempo, que o tempo tem tanto tempo quanto tempo o tempo tem";

"Grão a grão enche a galinha o papo";

"Água mole em pedra dura tanto bate até que fura";

"Roma e Pavia não se fizeram num dia";

"Há um tempo para tudo";

"Tudo a seu tempo".

A ideia era tornar clara uma ideia vigente/geral/tradicional/ sobre a questão e confrontá-la com as nossas percepções sobre o tema.

Foram recordados através de várias parábolas/histórias/escritos a questão do tempo de trabalho e do tempo livre ou supostamente livre.










As histórias:

1 – História real. O operário que ansiava por uma máquina nova que, supostamente, iria aliviar o seu trabalho, já que, com a existente, este era pesado e sujeito a avarias. Substituída a máquina por outra, mais moderna, o que aconteceu foi que o ritmo de trabalho, agora sem falhas, aumentou muito. A tecnologia, em vez de libertar, escravizou.

2 – História real. A família que anunciou às pessoas das suas relações que ia de férias e depois foi descoberta, por acaso, fechada em sua própria casa. Socialmente era "obrigada" a ir de férias.

3 – Cantiga popular. Foi recordada a existência de uma canção popular alentejana, o "Canto do Ceifeiro" (incluído num disco de Adriano Correia de Oliveira; não confundir com uma canção do mesmo título cantada por Francisco Fanhais), na qual está bem patente a percepção de tempo de exploração e do tempo livre. Os versos exprimem o desejo da chegada rápida da noite, ao mesmo tempo que se acusa o amo de querer que não se acabasse o dia.

Na conversa, para ilustrar a questão do papel da tecnologia, foi lembrado o significado da palavra "robot" que, em Russo significa "trabalhador".

Lembrada igualmente a ideia da Programação do Lazer, que não é nova e era utilizada nas ditaduras fascistas da Europa para "alegrar" os trabalhadores – Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho (FNAT, antigo INATEL).

O tempo livre é hoje também tempo produtivo (indústria do lazer)

Foi levantada a questão: Será possível uma sociedade altamente mecanizada e automatizada, em que as máquinas nos substituam na maioria das tarefas, com tempo de lazer?

Foi dado o exemplo actual de uma fábrica têxtil no Minho, que foi reorganizada pelos trabalhadores em auto-gestão e em que os seus ritmos de trabalho diminuíram.

Por outro lado, ligando o tempo livre à fruição do espaço, foi visto que nas cidades actuais existe uma falta de ligação das pessoas aos locais em que habitam e às pessoas que moram perto de si.

Existe também pouca disponibilidade para a criação de grupos que possam organizar eventos de lazer. As pessoas não têm papéis de protagonistas no seu lazer, mas apenas de consumidores.

A mobilidade actual no emprego dificulta também a criação de laços de solidariedade entre os trabalhadores que possibilite a construção de projectos em comum.

A luta laboral não é hoje tão determinante como pode ter sido outrora.

Os sindicatos lutam apenas para manter um sistema de concertação social








Pistas:

Foram reunidas sugestões das pessoas intervenientes na conversa no sentido de arranjar alguma proposta de solução para alguma das questões ali colocadas, nenhuma sugestão foi deixada à margem nem discutida em pormenor. Algumas delas:

· Reivindicar menos trabalho;

· Criar em comum e na horizontal iniciativas autónomas de animação dos espaço de vivência quotidianos;

· Criar uma federação anarquista para reunião das lutas;

· Reivindicar mais espaço na cidade para os peões, por exemplo [ironia] andando com os braços abertos;

· Lutar contra os direitos de autor sobre ideias, conteúdos e cultura;

· Realizar seminário (ou convento, por sugestão de alguns [ironia] ) de intervenção em lutas sociais;

· Criar alternativas de trabalho cooperativo que escape às malhas do capitalismo (selvagem ou não).

· Utilizar mais a bicicleta.










Iniciativa proposta pelo Colectivo Hipátia para o "Marquês em Festa"